A presença do Padre Eustáquio permanece viva e atual em tantos quantos o conheceram ou se aproximam de seu testemunho e de sua obra. Seu túmulo em Belo Horizonte, no novo Memorial do Santuário da Saúde e da Paz continua atraindo diariamente grande número de pessoas. As crianças, os adolescentes e os jovens estudantes, antes ou depois de ir às escolas que levam o seu nome, se ajoelham ou traçam um apressado sinal da cruz saudando o querido patrono.

Em Belo Horizonte, no comércio e em muitos lares, encontramos sua foto com aquele olhar claro, firme e penetrante. Agradecidos por muitas graças alcançadas os pais honram ao Beato atribuindo a seus filhos o nome de Eustáquio, Eustáquia e muitos compostos como Humberto Eustáquio, José Eustáquio, Maria Eustáquia, dentre tantos outros. Sua mensagem viva expressa a atenção aos enfermos e aos pobres como a marca de toda uma vida vivida no seguimento de Jesus. Uma vida de consagração aos Sagrados Corações de Jesus e Maria pela adoração diária a Jesus Eucarístico, alimentando assim seu ideal missionário e comunicando o que conhece e experimenta: Deus é Amor! Os pais e as mães de família ou os doentes e sofredores todos: desempregados, gente necessitada, mas sempre cheios de fé, esperança em agradecimento clamam:

“Roga por nós, Padre Eustáquio, vela por nós com amor.
Confiamos em vossa bondade, junto a Deus nosso intercessor.”

Família do Sr. Guilherme e D. Elizabete

O Padre Eustáquio van Lieshout nasceu na Holanda, em 1890. Família numerosa e muito religiosa. Dos nove filhos, além do Padre Eustáquio, mais duas de suas irmãs também seguiram a vocação religiosa. Seus pais foram o Sr. Guilherme e D. Elizabete.
Seu batizado foi no mesmo dia em que nasceu. Em 1901, recebeu a Primeira Comunhão e foi crismado em 1904. Próximo de completar 15 anos, no ano de 1905, ingressou no Seminário da Congregação dos Sagrados Corações.

 

 

São Damião inspira o seu ideal missionário

A juventude de sua região estava impressionada com o testemunho heroico do conterrâneo da Região da Brabância que se divide entre o sul da Holanda e o norte da Bélgica. As casas familiares dos dois missionários ficam a pouco mais de 110 km de distância. Desde pequeno o futuro Padre Eustáquio conhecia suas aventuras e heroísmo, mas, na adolescência, a leitura da vida de São Damião de Molokai encantou-o de tal forma que desde então seu grande sonho era ser missionário como o “apóstolo dos hansenianos”. Em 1915 o jovem Eustáquio professou os Votos de Pobreza, Castidade e Obediência tornando-se religioso dos Sagrados Corações como seu herói: São Damião de Molokai. Em 1919, recebeu a ordenação sacerdotal. Serviu ao Povo de Deus na Holanda em várias missões. Destacou-se de tal forma, que recebeu do Rei da Bélgica uma condecoração pelos serviços prestados aos refugiados belgas por causa da Primeira Guerra Mundial.

Padre Eustáquio missionário

Em 1925 seu ideal missionário se realizou. Foi um dos três fundadores da primeira comunidade da Congregação dos Sagrados Corações no Brasil, em Romaria, no Triângulo Mineiro. A partir de 1925, os três primeiros Religiosos dos Sagrados Corações se estabeleceram nas cidades que naquela época pertenciam à então Diocese de Uberaba: Padre Gil van den Boogaart, Padre Matias van Rooy e o Padre Eustáquio van Lieshout que foi o primeiro Pároco e construtor do novo Santuário de Nossa Senhora da Abadia da Água Suja, na atual cidade de Romaria-MG. Em 1926, fundaram o Colégio Regina Pacis, em Araguari-MG, e em 1927 o Ginásio Dom Lustosa, em Patrocínio-MG. Os primeiros diretores foram os Padres Gil e Matias respectivamente.

Valei-nos, Senhora da Abadia!

O Padre Eustáquio viveu em Romaria-MG, de 1925 até 1935, servindo também às paróquias de Indianópolis-MG e Iraí de Minas-MG. Construtor do atual Santuário de Nossa Senhora da Abadia da Água Suja, foi transferido para São Paulo sob protesto de seus paroquianos. O Pároco gozava de tamanho apreço entre seus fiéis que quando foi transferido chegaram a sitiar a casa paroquial e obstruir as vias de comunicação do município arrancando os “mata-burros”. Mesmo assim para cumprir a nova obediência que recebera partiu a pé até transpor os limites de Água Suja.

O Vigário de Poá

O Padre Eustáquio foi pároco em Poá-SP de 1935 a 1941 na paróquia Nossa Senhora de Lourdes. Como Jesus, Bom Pastor ele entregou sua vida pelos paroquianos: um especial carinho para com os doentes e os sofredores. Construiu uma gruta em honra de Nossa Senhora de Lourdes e disponibilizou água benta misturada com água que ele mesmo trouxera da França em sua peregrinação a Lourdes durante as férias na Holanda em 1935. O Pe. Venâncio Hulselmans, SS.CC. seu companheiro e primeiro biógrafo, relata em seu livro “O Vigário de Poá”, de 1944 que “o trabalho paroquial continua com a maior regularidade, porque os romeiros só procuravam água-benta e nada mais. Padre Eustáquio entra e sai sem a menor dificuldade; vai com os paroquianos à Aparecida do Norte, leva-os conforme costume, à adoração na Matriz de Santa Efigênia, enfim, faz tudo o que costumava fazer, sem atrair uma atenção especial. Aos poucos, porém, com a crescente fama da água, que levava a saúde onde quer que fosse usada, os romeiros não se contentam mais em tirar a água, mas querem ver o padre, falar com ele, pedir-lhe pessoalmente uma bênção, tanto para si como para a água. Bondoso por natureza, Padre Eustáquio atendia a um e a outro na saleta de visitas. As histórias de doenças e infortúnios que ouvia, comoviam-lhe o coração sempre compassivo e, consolando e confortando, terminava sempre com uma bênção pessoal, aconselhando o uso da água-benta”. Em Poá-SP, começaram os relatos de curas “miraculosas” que provocaram grande afluxo de pessoas. A pequena cidade não comportava o grande número de fiéis que o procurava diariamente. No mesmo livro do Pe. Venâncio podemos encontrar “um apanhado rápido de “curas” enviado por pessoas beneficiadas à Rádio Excelsior de São Paulo:

1) Eu tinha uma ferida na perna muito difícil de sarar, já tinha um ano e me doía muito. Eu já tinho ido ao médico e já tinha posto muitos remédios. Mas Deus me ajudou e eu ouvi falar nesse querido padre de Poá, levantei de madrugada e fui tomar o primeiro trem que para lá ia. Era cinco e meia da tarde e ainda não tinha chegado o meu número, era de 10.000. Às seis horas eu entrei e ele disse: lave com esta água e reze a S. José. Vi instantaneamente um grande milagre, gritei a todos de minha casa para que vissem o grande milagre recebido de Padre Eustáquio, com a vontade de Deus.

São Paulo, 19 de outubro de 1943. – Maria de Orio.

2) Minha filha Alayde, sofria, horrivelmente há 4 anos com uma nevralgia na cabeça, que me fez gastar uma exorbitância. Com grande dificuldade consegui no meio da multidão chegar perto dele e colocar com toda a confiança, sua mão na cabeça de minha filha, que ficou radicalmente curada.

São Paulo, 20 de outubro de 1943. – Mariana Marcondes Vieira

“Estes fatos entre dezenas de outros, fizeram sua propaganda e viraram a casa paroquial de Poá de cabeça para baixo. E o pior estava para vir. Em 4 de Março apareceram em cena os primeiros repórteres de “O Diário da Noite”, e no mesmo dia, por manchetes colossais e ampla documentação fotográfica, o grande público ficou sabendo que “EM POÁ HAVIA UM PADRE FAZENDO MILAGRES”. Este exemplo, logo seguido por outros jornais que diariamente, em reportagens sensacionais, relatavam minuciosamente, mais uma cura milagrosa do “SANTO DE POÁ”, levou o movimento a proporções fantásticas, na pequenina localidade. Os jornais arrastavam a população do estado inteiro e mesmo muitos peregrinos de outros estados.”

Exílio

A solução encontrada pelos seus superiores foi a de afastá-lo da paróquia a partir de 13 de maio de 1941. As autoridades civis e religiosas determinaram seu exílio para uma fazenda na cidade de Rio Claro-SP, e a troca de seu nome para Padre José, o que ele aceitou testemunhando obediência e humildade. Mais uma vez foi descoberto, a fazenda invadida por centenas de pessoas e a situação tornou-se cada vez mais difícil. Descoberto, iniciou uma peregrinação por vários lugares como Campinas-SP, Rio de Janeiro-RJ, e São Paulo-SP. Seu carisma e seus dons, o forte chamado à conversão, sua corajosa pregação e as bênçãos rituais de cura atraíram multidões. A fama de santidade do “Vigário de Poá” se espalhou por todo o país. A incontrolável situação tornou-se um problema até de saúde e segurança pública por onde passava.

Patrocínio e Ibiá

Ao Padre Eustáquio ficaram interditos todos os grandes centros do Brasil. Poderia morar numa das casas da Congregação no interior. Seu refúgio passa a ser o convento dos padres em Patrocínio–MG no então Ginásio D. Lustosa, a partir de 13 de outubro de 1941. A capela de Santa Luzia era seu campo de trabalho, mas com sérias restrições. Atendimento e bênçãos só no confessionário, onde chegava a ficar de sete a oito horas por dia. Sem uma queixa, Padre Eustáquio aceitou todas as condições. Em Patrocínio, experimentou novo ânimo. Mas lá permaneceu apenas quatro meses, de outubro de 1941 a fevereiro de 1942. Ele mesmo escreveu em dezembro de 1941:

“Fui assistir ao retiro e tive a felicidade de poder tratar intensamente da minha própria alma e recomendar de modo especial as intenções que tantas pessoas me pedem. Graças ao bom Deus, todos os dias conto com algumas conversões. Pessoas que anos e anos viviam afastadas de Deus e da Igreja, vejo voltar aos braços do nosso Divino Mestre. Quanto não há de transbordar o Coração de Jesus de verdadeira alegria! E eu não me sinto menos feliz com tantas ressurreições espirituais. Ganhar almas, aliviar dores e sofrimentos, eis aí meu grande ideal, inspirado por Deus! ”

A Congregação dos Sagrados Corações foi chamada para assumir uma nova missão. O superior, Pe. Gil, acreditava que a nova missão exigia alguém como Padre Eustáquio e o nomeou para Belo Horizonte-MG como pároco. Antes de partir para a capital mineira, foi enviado como pároco provisório à cidade de Ibiá-MG, onde nem completou dois meses, mas deixou plantado o projeto da Santa Casa que hoje leva seu nome. Após sua chegada a Ibiá, toda a redondeza de Araxá, São Gotardo, Campos Altos, Tiros, Pratinha… foi procurá-lo.

Belo Horizonte

Acolhido pelo Arcebispo D. Antônio Cabral, chegou a Belo Horizonte no dia 07 de abril de 1942. Em maio de 1943 apresentou à comunidade a maquete da futura Matriz dos Sagrados Corações. Foram apenas 16 meses de intenso apostolado a partir da capela de Cristo Rei, da antiga paróquia de São Domingos, futura paróquia dos Sagrados Corações. A procura do povo era três vezes maior que a capacidade da capela. Para organizar foi necessário adotar a distribuição de senhas através de um cartão numerado.

“Padre Eustáquio foi para Belo Horizonte enjeitado, ninguém sabia onde colocar Padre Eustáquio. Ele foi para Belo Horizonte com a obrigação de não fazer milagre. Pois para Deus não tem isso. Ele fez… trocou nome de rua, trocou nome de bairro, trocou nome de Igreja, trocou tudo… pra ver o que é a pessoa marcada por Deus. Padre Eustáquio com o seu ‘Saúde e Paz’ chegou a todas as famílias, de JK (Juscelino Kubitschek, então prefeito) até o mais simples e pobre dos cristãos”.

Cardeal D. Serafim Fernandes de Araújo, Arcebispo Emérito de Belo Horizonte

Missionário da Saúde e Paz

Além da própria paróquia, era chamado por toda parte e naqueles escassos 16 meses em Belo Horizonte ainda temos notícia de sua passagem por tantos bairros e cidades: Santa Tereza, Capela Maria Auxiliadora, Jornal O Diário, Lagoinha, Barro Preto, Floresta, Nova Lima, Itaúna, Montes Claros, Calafate, Colégio Imaculada, Instituto São Rafael, Catedral da Boa Viagem, Pedro Leopoldo, Engenho Nogueira, Bento Pires, Colégio Arnaldo, Patrocínio, Santa Casa, Instituto dos Industriários, Sanatório Minas Gerais, Renascença, Igreja de Lourdes, Colégio São Pascoal, Companhia Força e Luz, Colégio Sagrado Coração de Jesus…

Inesperada Doença

Uma repentina febre alta interrompeu por uma semana este intenso apostolado. No dia 30 agosto de 1943 faleceu vitimado por tifo exantemático ou febre maculosa, também chamada de febre do carrapato.

Reconhecimento e gratidão popular

Seu funeral foi uma verdadeira marcha triunfal. O enterro foi o início de uma apoteose. Seu túmulo no Cemitério do Bonfim continuou sendo visitado pelos fiéis. Imediatamente teve início uma constante peregrinação ao seu túmulo e a construção da igreja por ele projetada. No livro de tombo da Igreja Matriz podemos ler a anotação de 30 de agosto de 1944:

primeiro “aniversário da morte do padre Eustáquio, 1º vigário da matriz dos Sagrados Corações. Foram celebradas três missas por alma dele, assistidas por milhares de pessoas. O povo foi espontaneamente em grandes massas para o cemitério do Bonfim onde se acham os restos mortais. Os Padres conforme o desejo do Snr. Arcebispo não organizaram uma romaria. ”

A construção da Igreja dos Sagrados Corações tornou-se realidade e o povo carinhosamente passou a chamá-la de Igreja “do Padre Eustáquio”. Terminada uma parte da construção da Igreja, os restos mortais do religioso foram exumados e trasladados para um túmulo dentro da igreja no mês de janeiro de 1949.

Mais tarde, em 2007, um belo memorial foi construído, anexo à igreja. Ao centro o túmulo com as relíquias do Padre Eustáquio e nos vitrais foram retratados alguns momentos da sua vida e história. O local se tornou ponto de referência para os devotos. Em 2014, a igreja construída pelo religioso foi elevada a Santuário da Saúde e da Paz pelo Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte, Dom Walmor Oliveira de Azevedo.