Padre Eustáquio mantinha uma grande devoção à menina Odetinha, que recentemente foi proclamada Venerável pela Santa Sé, e por isso, por alguns anos ele manteve contato com os pais da garotinha, surgindo a partir daí uma bela amizade.
Foi por causa dessa vivência que Alice Vidal de Oliveira, mãe de Odetinha, prestou um depoimento para o Tribunal Eclesiástico da Causa de Beatificação e Canonização do Padre Eustáquio. Este depoimento foi colhido no dia 29 de outubro de 1963. Leia o documento, na íntegra, a seguir. Ele foi recuperado pelos pesquisadores que trabalham na catalogação do acervo do futuro Museu Padre Eustáquio de Belo Horizonte:
“Sob o período em que esteve aqui no Rio, posso atestar, como testemunha de ciência própria quanto segue: estando ele no Convento de sua Congregação e na Igreja dos Sagrados Corações confiada à mesma Congregação, digo na Igreja Santa Margarida, sendo que não sei mesmo se ele ia a esta Igreja; o fato é que fui procurá-lo no próprio convento.
A razão que me levou a este passo foi a seguinte: eu me achava doente do estomago de que vinha sofrendo há cerca de 3 anos, sendo opinião dos médicos de que eu me devia operar, meu marido, por sugestão de uma religiosa Madre Francisca Xavier das religiosas Concepcionistas do Divino Coração, falecida, a qual dizia que estava no Rio um Sacerdote da Congregação dos Sagrados Corações que estava fazendo milagres, meu marido, digo, porque queria que eu viesse, persuadiu-me a ir ter com o Padre. De minha parte não tinha maior interesse em procurar aquela cura pois eu preferia até ir-me embora, pois eu havia perdido os meus três filhos e não via mais propósito de continuar aqui já que muito doente eu não faria falta a meu marido. Apesar de tudo acedi à sugestão do meu marido, e me dirigi com ele ao convento onde estava o Padre Eustáquio.
Nem eu nem meu marido jamais o havíamos conhecido antes. Ao chegarmos à casa havia uma multidão de pessoas com muitos doentes e necessitados de toda a espécie que procuravam ver o Padre Eustáquio. Não consegui ver e muito menos falar com Padre Eustáquio. Assim dali saímos para a Igreja de Santa Margarida, digo, para a Capela anexa à casa religiosa e aí ficamos a rezar. Em dado momento, veio falar conosco Padre Felix irmão de hábito do Padre Eustáquio, para dizer-nos que naquela mesma tarde iria a nossa casa o Padre Eustáquio. Padre Félix era amigo de nossa família e sabia do mal de que eu padecia. Supondo que foi por isto que ele terá induzido o Padre Eustáquio a visitar-nos em casa. Efetivamente Padre Eustáquio apareceu em nossa casa por volta das 7 horas da tarde.
Estávamos em casa, meu marido e eu e mais três criadas, mas em menos de uma hora minha casa ficou cheia de outras pessoas que queriam falar com o Padre. Ficou o Padre Eustáquio em casa até às 9 horas da noite havendo ceado conosco, dali dirigiu ao seu convento. Cerca de 11 horas da noite recebi um telefone do Padre Gil, Provincial da Ordem pedindo-nos que abrigássemos naquela noite o Padre Eustáquio em nossa casa, porque o Cardeal Leme havia pedido a ele que retirasse o Padre Eustáquio do Convento. Assim foi que Padre Eustáquio voltou a nossa casa aí pernoitando.
Ao dia seguinte, as 05h45 da manhã o Padre saiu para dizer Missa no Mosteiro de São Bento em companhia de meu marido. Dalí voltou para nossa casa e permaneceu conosco aquele dia até 8h da noite quando o Dr. Lineu de Paula Machado veio buscá-la para levá-lo à fazenda São José de sua propriedade. Durante esse segundo dia que passou conosco, tinha ordem terminante dele, proibindo que qualquer pessoa se entrevistasse com ele. Com efeito, ao chegar em casa ele havia dito que se alguém o procurasse eu devia dizer que ele não receberia porque ele estava proibido, e que só podia confessar.
Ponderei-lhe então que viesse uma pessoa muito doente, se ele não receberia, ao que o Padre Eustáquio me respondeu: “se eu pudesse curar o mundo inteiro e a santa obediência me proibisse eu não faria”. Assim foi que, embora muita gente o tivesse procurado em nossa casa, ele não atendeu; a cada um que chegava eu dizia que o Padre Eustáquio não podia atender; todavia, levava ao conhecimento do Padre Eustáquio o nome das pessoas que o procuravam, mas o Padre se limitava a dizer que rezaria por eles, mas não poderia atendê-los.
Uma só pessoa foi atendida pelo Padre em confissão. Aquelas horas que passou em nossa casa, ele as dedicou à rezar o seu breviário e a escrever, mantendo-se sempre no quarto, havendo aí mesmo tomado as refeições, que eu lhe levava. Havia pernoitado e ao dia observei que a cama estava no mesmo estado mesmo que eu havia deixado, o que me fez supor que ele não tivesse dormido na cama. Tudo isto foi o que ocorreu em nossa casa no que respeita ao próprio Padre Eustáquio.
Quanto às pessoas a que ele atendeu no dia anterior, há de se registrar o seguinte: nossa casa, como disse antes se encheu dentro de uma hora de uma grande quantidade de pessoas. Padre Eustáquio, havendo feito uma visita ao quarto onde morreu nossa filha, no que foi acompanhado pelo meu marido, o qual, nessa ocasião, deve ter-lhe falado do meu estado de saúde, desceu do quarto e ao encontrar-se com aquelas pessoas que estavam em casa, foi alvo de inúmeros pedidos de pessoas que procuravam falar com ele em particular, tocá-lo, sendo essas pessoas contidas por dois senhores para evitar qualquer tumulto.
Disse, então, o Padre Eustáquio aos presentes: “Vou dar a benção de nossa Mãe e Santa Igreja especialmente para os doentes”. Abrindo o seu livro de orações recitou a fórmula da benção em latim e tirando do seu bolso um hissope com água benta ia aspergindo uma por uma as pessoas que estavam ajoelhadas na sala; como eu não estivesse ajoelhada ele me ordenou que eu me ajoelhasse e eu o fiz e me veio uma crise de pranto.
Havia ainda outras pessoas no corredor e sobre estas pessoas que não puderam ajoelhar, ele também as aspergiu com água benta. No que me diz respeito, devo dizer que após ter sido aspergida naquela benção eu esqueci-me de qualquer dor ou mal estar e até hoje nada mais sinto.”
Alice Vidal de Oliveira (mãe da Venerável Odetinha) – 29/10/1963
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